Alimentos processados não representam todos o mesmo risco para a saúde. Saiba escolher

A demonização dos alimentos processados e ultraprocessados é uma constante nos debates sobre nutrição, mas será que todos os produtos que encontramos nas prateleiras dos supermercados merecem a mesma má reputação? A ciência nutricional revela que a realidade é mais complexa, e oferece ferramentas para fazer escolhas mais conscientes e saudáveis.


Num artigo anterior destacámos os resultados de um estudo recente que mostrou como os alimentos ultraprocessados podem afetar negativamente a saúde metabólica e reprodutiva dos homens, mesmo quando a dieta parecia equilibrada em calorias e nutrientes. Esses dados sublinham a importância de refletirmos sobre o impacto desse tipo de produto na nossa vida diária.

Contudo, é igualmente essencial não cair no extremo oposto e considerar que todos os alimentos processados e ultraprocessados são automaticamente prejudiciais. A ciência mostra que a realidade é mais complexa, e que existem diferentes níveis de processamento com implicações distintas para a saúde.

O que é um alimento ultraprocessado?

Apesar dos inúmeros estudos que associam o consumo de certos alimentos processados a problemas de saúde, muitos especialistas sublinham que os termos “processado” e “ultraprocessado” representam categorias vastas. Embora úteis como orientação geral, podem ocultar vários aspetos.

Para clarificar esta questão, é útil recorrer a sistemas de classificação como o NOVA, um método reconhecido e utilizado por entidades como a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). Este sistema divide os alimentos em quatro grupos distintos com base no seu nível de processamento.

  • O primeiro grupo (NOVA 1) engloba os alimentos não processados ou minimamente processados, como fruta e vegetais frescos, que chegam à nossa mesa praticamente no seu estado natural.
  • O segundo grupo (NOVA 2) refere-se a ingredientes culinários processados, como o azeite, o açúcar, o sal ou a manteiga – produtos extraídos da natureza e utilizados para preparar refeições, mas que raramente são consumidos isoladamente.

As categorias mais relevantes neste debate são a dos alimentos processados (NOVA 3) e a dos ultraprocessados (NOVA 4).

  • Os processados (NOVA 3) são produtos que sofreram alterações intermédias, como as leguminosas em conserva, enchidos ou peixe fumado.
  • Já os ultraprocessados (NOVA 4) são formulações industriais complexas, geralmente com uma longa lista de ingredientes que inclui aditivos e substâncias não utilizadas na culinária doméstica.

Nem todos os processados são criados da mesma forma

A perceção geral é que os alimentos ultraprocessados são nutricionalmente pobres, densos em calorias, gorduras e açúcares, e com baixo teor de fibras e vitaminas. Contudo, mesmo dentro desta categoria, existe uma diversidade considerável.

Um estudo publicado na revista científica British Medical Journal (BMJ) destacou que, embora exista uma correlação entre um elevado consumo de ultraprocessados e uma menor esperança de vida, a relação não é linear para todos os produtos.

Isto significa que nem todos os alimentos classificados como ultraprocessados apresentam o mesmo perfil de risco para a saúde, o que torna importantíssimo a capacidade de discernir entre eles.

📝 Três estratégias para fazer escolhas mais saudáveis

Num artigo para a plataforma The Conversation, Clare Collins, especialista em nutrição e dietética da Universidade de Newcastle, na Austrália, partilhou algumas sugestões práticas para selecionar os alimentos processados e ultraprocessados que representam um menor risco.

  • A primeira recomendação é analisar atentamente a lista de ingredientes. A especialista aconselha a procurar produtos com menos aditivos e com ingredientes que reconheceríamos numa cozinha tradicional.
    • É importante notar que alguns aditivos podem ter nomes técnicos para substâncias comuns, pelo que nem todos são prejudiciais. No entanto, uma lista de ingredientes extensa e repleta de nomes indecifráveis é, geralmente, um indicador de um elevado grau de processamento.
  • Em segundo lugar, deve-se prestar atenção à informação nutricional presente nos rótulos. Sistemas como o Nutri-Score, embora não sejam perfeitos, podem ser uma ferramenta útil para comparar produtos da mesma categoria e tomar uma decisão mais informada de forma rápida.
  • Por fim, o terceiro conselho de Collins é refletir sobre a frequência de consumo. O consumo esporádico de um alimento ultraprocessado não compromete, por si só, o bem-estar de uma pessoa. O perigo reside no hábito.

Assim, a especialista recomenda que se concentrem os esforços de melhoria nos produtos que são consumidos uma ou mais vezes por semana, procurando alternativas mais saudáveis para esses alimentos específicos.

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