Alkantara 2025 traz a Lisboa vivências do mundo feitas de dor e alegria

Novembro está mais perto do que parece. A contagem decrescente para o Alkantara Festival, que regressa a Lisboa de 14 a 23 de novembro,está em curso. Dorothée Munyaneza, Vânia Doutel Vaz, Chiara Bersani e María del Mar Suárez são alguns dos nomes já confirmados.

“Todas as noites, o meu sono é trespassado pelo mesmo pesadelo. Há alguém a perseguir-me, ouço como que um zumbido que se eleva até mim, um burburinho cada vez mais ameaçador. Não me viro. Não vale a pena. Sei quem me persegue… Sei que têm machetes.” A escrita poderosa da autora ruandesa Scholastique Mukasonga poderia ecoar no espetáculo de uma sua conterrânea, a coreógrafa Dorothée Munyaneza, que abre o Alkantara 2025 com o espetáculo “umuko”, a 14 de novembro, na Culturgest.

Nascida depois do genocídio contra a população tutsi no Ruanda, que dilacerou o país africano em 1994, Munyaneza, celebra o amor, a alegria e a solidariedade como antídotos para a violência, a dor e memórias dilacerantes de quem sobreviveu. “Umuko” é uma árvore ancestral de flores vermelhas vivas, símbolo de cura e guardiã das histórias que atravessam gerações. E o pilar da nova peça da coreógrafa ruandesa, que há 28 anos deixou a sua terra natal. É em “umuko” que projeta o futuro e a resistência contra a precariedade do quotidiano.

No ano passado, Munyaneza venceu a primeira edição do Salavisa European Dance Award, prémio criado pela Fundação Calouste Gulbenkian, em colaboração com outras seis instituições artísticas europeias, com o objetivo de distinguir artistas de todo o mundo que “demonstrem talento ou qualidades especiais que mereçam ser mais conhecidos para além das suas fronteiras nacionais”.

Vânia Doutel Vaz, bailarina e coreógrafa angolana nascida em Setúbal, apresenta pela primeira vez em Lisboa, no TBA, violetas. Não está só nesta peça de dança íntima e intimista. Acompanham-na Lua Aurora, Lucília Raimundo, Piny e Wura Moraes. Cinco intérpretes habitam o palco e os seus limites, experimentando o corpo que dança como matéria única e suficiente, sem música, sem cenografia. Propondo uma escuta que vai além da superfície, violetas joga com a expectativa, a perceção e o que projetamos sobre os corpos em cena. A primeira peça de grupo de Vânia Doutel Vaz teve uma aclamada estreia na edição deste ano do DDD – Festival Dias da Dança, no Porto, e estará em Lisboa de 21 a 23 de novembro. Um regresso ao Alkantara Festival, onde a bailarina se estreou na criação, em 2023, com o solo O Elefante no Meio da Sala.

Chiara Bersani – intérprete e criadora italiana ativa no campo das artes performativas, teatro de pesquisa e dança contemporânea – deixa de lado a sua prática habitual, a solo, para propor trajetórias onde artistas com deficiência possam crescer, trabalhar e ser vistos. Michel – Os animais que sou resulta do convite do Alkantara e do CAM, que cocomissariam a sua nova criação. A mensagem? Há muitos ‘Michéis’, “muitas pessoas brilhantes com corpos não normativos.” A peça será apresentada de 20 a 22 de novembro no CAM – Centro de Arte Moderna Gulbenkian, e assinala mais um regresso ao Alkantara Festival depois de Gentle Unicorn, apresentado em 2021 no Teatro Nacional D. Maria II.

Transgressão e recomeço. É esta a proposta subjacente a Os intransponíveis Alpes, à procura do Currito, da coreógrafa andaluza María del Mar Suárez, também conhecida como La Chachi. Nesta fusão de flamenco, teatro físico e dança contemporânea, a viagem faz-se, física e emocionalmente, entre o trágico e o absurdo. No centro de tudo está a busca de “Currito” – figura ausente, evocada, inalcançável (um novo/velho Godot?) – metáfora do desejo, da fé, da perda ou do amor. Dois músicos e uma cantora estarão em palco irão marcar o ritmo, a catarse. A 21 e 22 de novembro, no CCB.

Como já é habitual, o festival partilha-se por vários espaços, da Culturgest, Teatro do Bairro Alto, Centro Cultural de Belém e Centro de Arte Moderna Gulbenkian, à nova Sala Valentim de Barros nos Jardins do Bombarda – em parceria com o Teatro Nacional D. Maria II –, passando pelas Galerias Municipais de Lisboa, MAAT, ZDB 8 Marvila e Carpintarias de São Lázaro.

A programação completa do Alkantara Festival 2025 será anunciada em outubro, mas pode consultar aqui os espetáculos de dança, teatro, performance e encontros desenhados e confirmados para a edição deste ano.