É quase impossível um satélite “estragar” a foto de outro. Com a Starlink, já aconteceu 2 vezes

O que antes era um acontecimento astronómico extremamente improvável, está a tornar-se um fenómeno cada vez mais comum no espaço. A crescente constelação de satélites da Starlink está a gerar ‘photobombs’ inesperados em imagens captadas por outros dispositivos em órbita…


Satélite da Starlink já “estragou” duas imagens

A ideia de um satélite de observação terrestre conseguir fotografar, por mero acaso, outro satélite em movimento era, até há pouco tempo, considerada um evento de uma raridade extraordinária.

O espaço é vasto e os objetos em órbita movem-se a velocidades vertiginosas. Contudo, só no último ano, este cenário repetiu-se por duas vezes, e em ambas as ocasiões, o “intruso” foi um satélite da Starlink, operado pela SpaceX.

O caso mais recente ocorreu a 21 de agosto. Um dos novos satélites WorldView Legion, da empresa Maxar, sobrevoava o deserto de Gobi, na China, com a missão de captar imagens da base aérea de Dingxin: uma instalação de alta segurança onde as forças armadas chinesas testam os seus caças mais sofisticados.

A imagem foi obtida com sucesso, mas continha um elemento surpresa: um rasto multicolorido atravessava o enquadramento.

O “mistério” desvendado

O que parecia ser “arte acidental”, como descreveu uma executiva da Maxar no LinkedIn, era, na verdade, o satélite Starlink 33828. Este foi imortalizado em diferentes comprimentos de onda sobre uma das localizações mais sensíveis do exército chinês. A imagem exibe uma nave prateada com dois painéis solares proeminentes, acompanhada por três espectros de cores.

Este curioso efeito visual explica-se pela tecnologia das câmaras de observação e pela incrível velocidade a que os satélites se deslocam. Estes equipamentos não captam uma única fotografia, mas sim uma sequência de imagens em diferentes bandas espectrais de forma quase instantânea.

Produzem uma imagem pancromática (a preto e branco) de alta resolução e várias outras de menor qualidade em diferentes cores (vermelho, verde, azul, etc.). Posteriormente, um algoritmo combina toda esta informação para gerar a imagem final, nítida e a cores.

O problema reside no “quase”. Quando o alvo é a superfície terrestre, que se encontra relativamente estática em relação ao satélite, o sistema funciona na perfeição. No entanto, quando outro satélite cruza o campo de visão a uma velocidade relativa de cerca de 5000 km/h, a câmara regista-o numa posição ligeiramente diferente em cada uma das camadas de cor. O resultado é este rasto espectral com várias “sombras” coloridas.

Não foi a primeira vez! Já aconteceu no Google Maps

Este incidente não é um caso isolado. Em abril de 2025, um utilizador do Reddit já tinha identificado um fenómeno semelhante numa imagem do Google Maps, que retratava uma área rural no Texas, Estados Unidos.

Nessa situação, a fotografia tinha sido captada por um satélite europeu Pléiades. O resultado foi ainda mais nítido, exibindo cinco silhuetas distintas do mesmo objeto. Cada uma correspondia a uma banda espectral diferente: infravermelho próximo, vermelho, azul, verde e a pancromática.

O que antes era um evento astronómico improvável está a transformar-se numa nova normalidade, impulsionada pela crescente densidade de satélites em órbita baixa.

📝 Por que razão são sempre satélites Starlink?

  • Primeiro, a SpaceX já possui mais de 8300 satélites Starlink em órbita, um número que supera o total de todas as outras constelações de satélites combinadas. Com planos para expandir esta rede para mais de 30.000 unidades, a probabilidade de um deles se cruzar com a objetiva de outro satélite só tende a aumentar.
  • Segundo, para fornecer uma ligação à internet com baixa latência, os satélites Starlink operam a aproximadamente 500 km de altitude, na chamada órbita terrestre baixa (LEO). Esta é precisamente a mesma “autoestrada” orbital utilizada pela maioria dos satélites de observação, como os WorldView Legion da Maxar, que orbitam a 518 km. Com trajetórias tão próximas, os encontros são inevitáveis.

Para além da curiosidade visual, estas imagens servem como um sintoma claro de que a órbita baixa está a ficar cada vez mais congestionada. Esta situação obriga os operadores a realizar constantes manobras de evasão para evitar colisões potencialmente catastróficas.

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