Fundação norte-americana propõe à ONU “aliança” para distribuir a sua ajuda em Gaza

A FHG é a única entidade encarregada de distribuir ajuda alimentar na Faixa de Gaza desde o final de maio, altura em que Israel voltou a permitir a entrada de ajuda humanitária naquele território palestiniano, após quase três meses de bloqueio total, mas a quantidade distribuída é muito inferior àquela de que, segundo as organizações internacionais, a população necessita.

O diretor da Fundação Humanitária para Gaza, encarregada por Israel de distribuir alimentos em Gaza com um sistema controverso, propôs hoje à ONU uma “aliança” para distribuir a ajuda humanitária da organização retida em camiões na fronteira.

Numa videochamada, John Acree, diretor executivo da norte-americana Fundação Humanitária para Gaza (FHG), propôs uma aliança com a ONU, depois de esta ter, em várias ocasiões, criticado o modelo de distribuição da FHG, que opera apenas em quatro pontos da Faixa de Gaza (em contraste com os 400 que a ONU tinha), rodeados de zonas militarizadas onde se registaram até 31 de julho, segundo o Gabinete das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), 859 mortos, abatidos por fogo israelita.

A FHG é a única entidade encarregada de distribuir ajuda alimentar na Faixa de Gaza desde o final de maio, altura em que Israel voltou a permitir a entrada de ajuda humanitária naquele território palestiniano, após quase três meses de bloqueio total, mas a quantidade distribuída é muito inferior àquela de que, segundo as organizações internacionais, a população necessita.

Por isso, todos os dias morrem pessoas de subnutrição e se têm elevado as vozes da comunidade internacional acusando Israel de genocídio e de usar a fome como arma de guerra.

É certo que, paralelamente, as autoridades israelitas autorizaram a entrada em Gaza de alguns camiões com ajuda da ONU e de outras organizações, mas a conta-gotas, em quantidade muito inferior às necessidades diárias, estimadas em 500 camiões por dia, em vez dos 50 a 100 diários entrados em junho e de cerca de 200, nos últimos dias.

Tal agravou a situação de fome catastrófica já diagnosticada pela ONU em 2024 no enclave devastado por quase dois anos de ofensiva israelita.

Além das mortes desde maio ocorridas perto dos pontos de distribuição de alimentos da FHG por o Exército israelita ter aberto fogo sobre civis esfomeados, segundo o OCHA, até ao final de julho, foram também registadas 514 mortes em assaltos a camiões da ONU realizados por centenas de civis em busca de comida e também por gangues organizados de Gaza.

Centenas desses camiões (milhares, segundo o Governo de Gaza, do movimento islamita palestiniano Hamas) estão concentrados na fronteira do território, o que as organizações humanitárias atribuem ao facto de Israel não lhes garantir rotas seguras, recusando-se a abrir corredores humanitários.

“Este caos não só é trágico, como também inaceitável”, declarou Acree sobre os assaltos aos camiões, mas sem mencionar as mortes a tiro perto dos pontos de distribuição de ajuda da FHG, afirmando, em vez disso, que a fundação distribuiu a comida “sem comprometer os civis” nem os seus trabalhadores.

“Desde que as Nações Unidas retomaram a sua missão vital de entregar ajuda em Gaza, em maio, o esforço tem sido constantemente minado por uma dura e perigosa realidade no terreno: a anarquia, a presença de bandos armados e a ausência de uma ordem civil funcional”, afirmou, acrescentando que, por isso, propõe “uma aliança entre as Nações Unidas e a Fundação Humanitária para Gaza”.

Segundo Acree, essa aliança poderia incluir apoio operacional e de segurança aos comboios da ONU — a FHG contrata mercenários para distribuir a ajuda —, a possibilidade de a entregar nos seus quatro pontos de distribuição e também ampliar a distribuição a outras zonas — nenhum dos seus pontos se situa no norte da Faixa de Gaza, onde se encontra mais de metade da população.

O diretor assegurou que a FHG tentou várias vezes apresentar esta proposta à ONU, mas que os responsáveis presentes nas reuniões as interromperam e não houve resposta às suas cartas.

Até agora, tanto a ONU como outras organizações humanitárias que operam em Gaza recusaram-se a colaborar com este sistema de distribuição, que consideram contrário ao Direito Internacional Humanitário, por ser militarizado e ocorrer em poucos pontos, o que obriga os esfomeados habitantes de Gaza a caminhar quilómetros para lá chegar.

Além disso, a abertura dos pontos de distribuição alimentar é comunicada com muito pouca antecedência (menos de uma hora), a comida acaba em minutos e o critério para a distribuir é a ordem de chegada, numa corrida frenética para conseguir alguma coisa, o que provoca caos e, por vezes, violência entre os próprios habitantes, que enfrentam também o Exército israelita, que por vezes dispara sobre aglomerações de pessoas.