
A reforma da lei laboral tropeçou logo no essencial: debate consistente e medidas robustas. Em vez disso, o Governo usou o velhíssimo truque de lançar temas sensíveis — os dias de luto e a amamentação — para servir de moeda de troca com os sindicatos, ossos duros de roer. Mas alguém hoje ainda se deixa enganar? A estratégia, superficial e oportunista, revela falta de convicção e empobrece o debate nacional. O projeto falha porque ignora muito problemas reais.
A flexibilidade do mercado laboral não é inimiga da proteção dos trabalhadores. Pelo contrário: é fundamental ter instrumentos como subsídio de desemprego digno, não a miséria atual, e formação profissional eficaz (não cursos surreais) para garantir transições e requalificações verdadeiras. O que se esperava era uma lei consequente, capaz de lidar com a diversidade das empresas e que introduzisse um banco de horas útil, transparente e adaptado a novas formas de trabalho.
O que está sobre a mesa fica, para já, a meio do caminho: não serve os empresários e gestores e não serve os trabalhadores. Há mesmo um ponto chocante: a ausência de discussão sobre a função pública. Manter um universo de 800 mil pessoas protegido do mercado e do escrutínio competitivo desequilibra objetivos de eficiência, justiça e mérito. Não se trata de nivelar por baixo, mas de enfrentar uma realidade que a política, refém de um infantil eleitoralismo primário, limita o desenvolvimento do país.
Aumentar a flexibilidade dos contratos a termo certo – que passam a poder manter-se durante três anos, em vez dos atuais dois – é uma traição aos mais jovens. E mais esta: hoje, após despedir trabalhadores por extinção de posto ou despedimento coletivo, as empresas ficam proibidas de contratar novos funcionários para essas funções através de terceiros (outsourcing) durante um ano. A lei funciona, ajuda a reduzir a precariedade, mas o Governo quer acabar com este travão. Pois então que siga ladeira abaixo a acelerar até estragar de vez uma reforma que poderia ajudar Portugal a crescer mais.