
Na estrada nacional 323 (EN323), em zonas, por exemplo, como Pera Velha e Granja do Pavia, o único colorido da paisagem negra é o das casas, “porque as pessoas não dormiram por dois ou três dias para salvar os seus pertences”, disseram à agência Lusa os populares.
“Aqui na empresa, na primeira noite, de quinta para sexta-feira, ninguém dormiu, depois começámos a fazer turnos, porque ninguém ia aguentar. Ao todo, somos oito pessoas, mais amigos e família. Foi assim que salvámos as casas, o resto foi tudo”, apontou Conceição Cerdeira.
Os Granitos do Paiva “foram salvos pelos funcionários, porque à volta, como se pode ver, está tudo queimado”, continuou, mas basta dar uma volta por aí, pelas povoações, para perceber a dimensão do incêndio”.
“Foram pinhais, soutos, muitas colmeias, foi tudo”, resumiu.
Ao lado, Ana Maria Santos disse que “ardeu muito do que é um complemento ao sustento para várias pessoas, mas, noutros, foi mesmo o sustento” delas.
“Espero que haja ajudas para os que mais sofreram com tudo isto”.
Nos seus 69 anos, Ana Maria Santos disse que tem assistido a “alguns fogos, regra geral para os lados de Leomil, mas, como este, nunca. Ardia por todo o lado e ao mesmo tempo”.
“Como é que vem lá de Sátão e chega aqui em poucas horas? Como é que arde desta forma em todo o lado e ao mesmo tempo? Como é que há chamas assim em toda a volta?”, questionou-se Ana Maria Santos.
“Se não fossem as pessoas, com os seus pertences, as enxadas e os baldes, com a maquinaria da agricultura, teria sido bem pior do que foi”.
Cristina Conde adiantou à agência Lusa que “os dois soutos que tinha arderam por completo”.
“Um que era dos meus avós, com castanheiros seculares, foi todo. Era um hectare”, descreveu.
Um outro, de seis hectares, “era novo, ia ter castanha pela primeira vez com um bocadinho mais abundância, eram castanheiros com seis anos, também ardeu todo”.
Também na Aldeia de Nacomba, Alfredo da Costa, aos 76 anos, já testemunhou “muitos incêndios, mas grandes e fortes” guarda na memória “os de 1977 e de 1990 e agora este que foi muito mais violento e forte”.
“A velocidade das chamas e a forma como ardia não tem nada a ver com os outros. Também lhe digo, os outros eram combatidos e seguravam-se, já este não. Os bombeiros diziam que estavam a guardar a água para salvar as casas”, contou.
Mas “quem salvou a Aldeia de Nacomba foram os populares, porque os bombeiros ficaram junto às casas e as pessoas é que foram para a frente de fogo segurá-lo e ele não chegou à povoação”.
“Eu entendo que em vez de o Governo gastar rios de dinheiro nos aviões [de combate], havia de dar esse dinheiro às Câmaras que, juntamente com as juntas de freguesia, trabalhariam para manter os territórios limpos e organizados”, defendeu.
Uma medida que “daria mais emprego às pessoas e as aldeias estariam muito mais protegidas”, por quem conhece.
“Os bombeiros diziam que as ordens eram do comandante que vinha lá não sei de onde. O que é que ele sabe da nossa terra? O que é que ele conhece? Nada. E por isso é que os bombeiros não podiam gastar a água e se fossemos nós a cuidar do que é nosso acho que isto não acontecia”, argumentou.
O fogo que chegou a Moimenta da Beira teve origem em dois incêndios — no dia 13, em Sátão (distrito de Viseu) e no dia 09, em Trancoso (distrito da Guarda) — e na sexta-feira tornou-se um só, que se alastrou a 11 municípios dos dois distritos.
Os 11 municípios são Sátão, Sernancelhe, Moimenta da Beira, Penedono e São João da Pesqueira (distrito de Viseu); Aguiar da Beira, Trancoso, Fornos de Algodres, Mêda, Celorico da Beira e Vila Nova de Foz Côa (distrito da Guarda).
Este incêndio entrou em resolução pelas 22:00 de domingo.