Escrevíamos em 2021, a propósito da Cervejaria Liberdade, que “no que toca aos lugares-comuns das cervejarias, com aquários em jeito de mostra de mariscos e cerveja a debitar de torneiras, este é cenário que não se acomoda à Cervejaria Liberdade. Os tanques com o marisco moram na cozinha e a carta de cervejas foi substituída por uma robusta carta de vinhos.”
Volvidos três anos, é tempo de rever essa descrição. A carta de vinhos continua robusta e agora há espaço para cervejas artesanais. Mas o tanque “deixou” a sombra da cozinha e passou a ser protagonista logo à entrada, revelando-se numa montra vívida de marisco fresco, em celebração aberta ao que o mar nos dá. Mas não só. Há também novidades em termos de peixe fresco. As transformações não são apenas arquitetónicas, são também uma afirmação de identidade deste restaurante que tem o nome da Avenida que lhe dá morada, em Lisboa.

“Sempre tivemos mariscos vivos, sempre. E continuamos a ter aquários na cozinha, mas agora trouxemos um aquário para fora, para mostrar o que temos diariamente”, explica Luís Santos, diretor do restaurante. “Fizemos também uma banquinha de peixe. Hoje temos rascasso, lírio, linguado, robalo e salongo. Queremos apostar em peixe nacional, de mar. E dar destaque a espécies que não se encontram todos os dias nos restaurantes”, completa.
A recente remodelação do espaço, cujas obras duraram dois meses e meio, assinada pelo atelier Vibbes Design, trouxe à luz uma nova configuração mais fluida, mais acolhedora e, sobretudo, mais fiel ao espírito da casa.
O mobiliário, desenhado à medida, reflete a mesma atenção ao detalhe: mesas em madeira natural, terrazzo ou pedra Calacatta Roma Silk com apontamentos metálicos convivem com cadeiras de veludo, sofás e bancos de bar. A iluminação, pensada para o conforto, inclui candeeiros de mesa de brilho suave e novas cúpulas sobre os lustres já existentes, criando um ambiente intimista e envolvente.

Em homenagem ao artista Jean Lurçat — autor da peça “Zodíaco”, produzida pela Manufactura de Tapeçarias de Portalegre e presente na sala desde 1961 — a curadora Felipa Almeida reuniu 50 peças de cerâmica, antigas e contemporâneas, que dialogam com a obra têxtil. Entre moringues de Estremoz, peças em verguinha das Caldas da Rainha e criações de artesãos como Mestre Xico Tarefa, Rosa Ramalho ou Vincent Richeux, a seleção responde aos elementos da fauna, flora e astrologia que habitam a tapeçaria.
Três zonas distintas e interligadas — receção, bar e sala principal — convidam a viver a Cervejaria Liberdade em diferentes tempos e modos. A sala nobre mantém o pé-direito generoso, de cinco metros, mas os materiais e texturas quentes trouxeram-lhe um novo conforto. O aquário, a zona de vinhos e a montra logo à entrada funcionam agora como o novo coração do restaurante, num ritmo que bate entre a tradição e a sofisticação.
Mais do que um restaurante, um lugar de memória
A retirada do balcão que se encontrava no meio da sala foi uma das mudanças mais sentidas. “Quando sentávamos alguém naquele lado do balcão, as pessoas não gostavam. Cortava o espaço e perdia-se a noção do que isto é realmente”, comenta Luís Santos. Com o espaço mais amplo, a sala principal está também mais convidativa. “Aprimorámos um bocadinho mais pelo conforto, não pelo número de pessoas. Ontem servimos 130 refeições. Temos capacidade para 142 lugares incluindo a esplanada”, diz o diretor.

A barra, uma das grandes novidades, veio ocupar o antigo bar de ostras, antes de se entrar na sala principal e é agora um espaço próprio e ativo — onde se pode petiscar durante todo o dia — e confere ao restaurante uma vivacidade descontraída, sem descurar a elegância. Este é também o local ideal para explorar a carta de bebidas do restaurante.
E sim, mantém-se a cozinha de sala: os tártaros, os peixes e até sobremesas são preparados diante do cliente, em respeito ao produto e ao gesto que o serve.
Sob a batuta do chef Miguel Silva, a carta também se abre a novas leituras, sem renegar os clássicos que ajudaram a construir a reputação da casa. Peixe grelhado, marisco ao quilo, Bacalhau à Brás (29€), Arroz de marisco (39€), Bife de Lombo de Novilho à Cervejaria (37€) e o incontornável Bife Tártaro à Tivoli (32€).
Entre os petiscos, ideais para partilhar na barra ou à mesa, brilham o Recheio de sapateira (25€), Croquetes de novilho (9€), Camarão com alho e malagueta (19€), Amêijoas à Bulhão Pato (25€) ou Ostras — da Ria Formosa e do Sado — a 5€ a unidade.

Nas novidades o Arroz de peixe com salicórnia e limão (36€), o Lombo de bacalhau com grão e couve-coração (35€) e Perna de pato confitada com arroz de enchidos (34€).
Na carta de doces, os intocáveis Crepes Suzette (16€), Tarte de maçã caseira com gelado (12€) e Sopa de morangos (19€) dividem protagonismo com o Bolo de bolacha (14€), Doce da casa (14€) e Farófias tradicionais (10€). Há ainda mousse de chocolate 70% cacau (14€) e leite-creme (12€).
“Praticamente todas as nossas sobremesas são preparadas na sala”, explica Mónica Azevedo, chef de pastelaria. “O leite-creme é queimado na hora, o bolo de bolacha é feito camadinha a camadinha à frente do cliente. Até as farófias são finalizadas na sala, com o creme inglês servido à parte”, assegura, acrescentando que “o crepe Suzette e a sopa de morangos? Mais especialistas do que os nossos empregados não há”, garante, entre risos.

Além da oferta à carta, a Cervejaria Liberdade mantém os menus de almoço, disponíveis de segunda a sexta-feira (12h30 às 15h00, exceto feriados e dias festivos). O Menu Executivo (35 €) inclui entrada, prato principal ou prato principal e sobremesa, com água e café ou chá. O Menu Completo (43 €) acrescenta entrada, prato principal e sobremesa.
“Estamos a evoluir sem mudar o legado do espaço. A cozinha é descomplicada, pensada para ser eficiente e saborosa. Acima de tudo, fiel ao que sempre fomos”, sublinha o chef Miguel Silva.
A aposta nas cervejas artesanais apresenta-se com três referências portuguesas da Pato Brewing: a Patinho Pale Ale (6,5€), a Alva DIPA (6,5€) e a Barbary Wonder Pilsner (6,5€). Uma oferta que amplia as possibilidades de harmonização e convida a sair da zona de conforto.

Na carta de vinhos, há mão nova e critério rigoroso: Jorge Silva desenhou uma seleção eclética, centrada em pequenos produtores nacionais e em harmonizações pensadas ao detalhe, até para as sobremesas.
“Queremos vinhos com terroirs específicos, tal como os nossos peixes têm proveniências distintas”, explica o diretor de vinhos do grupo Tivoli. “Claro que continuamos a ter vinhos de maior indústria, como os da Sogrape. Mas queremos dar mais detalhe, mais presença. Fizemos um investimento nos copos, nas cartas e na presença de sommeliers em permanência”, explica-nos.
O restaurante passa a incluir vinhos em verticais — mesmo vinho, anos diferentes —, e cada espaço do Tivoli tem uma carta própria. “Na cervejaria, vinhos para peixe. No Seen, vinhos adequados ao local. Cada espaço com a sua identidade”, assegura.

Jorge Silva explica ainda que “vamos fazer sugestões de pairing com as sobremesas, sempre com vinhos portugueses. Temos também cocktails de assinatura com vinho do Porto branco, a enaltecer o produto nacional”. Apesar de a carta também contemplar algumas referências internacionais, como Champanhes, o responsável faz a ressalva que em termos de propostas nacionais, “não é uma questão de ter vinhos de todas as regiões, é sim uma questão de identidade.”
A nova carta de cocktails também reclama atenção, com criações de assinatura que ligam o bar à identidade artística e gastronómica da casa. O Lurçat (16€), inspirado na tapeçaria “Zodíaco” de Jean Lurçat, combina notas aromáticas e um perfil visual pensado para dialogar com a peça central da sala. O Pirata do Tejo (14€) homenageia a tradição marítima lisboeta com um toque cítrico e especiado, enquanto o Astro-Rei (14€) presta tributo ao sol de Lisboa, brilhando tanto na cor como no sabor. O Tradição (13€), feito com Porto branco e espumante, honra clássicos portugueses num brinde elegante ao produto nacional. Há ainda opções sem álcool que mantêm o mesmo rigor de apresentação e equilíbrio de sabores.
Entre os azulejos artesanais da Maora Ceramic, a loiça Vista Alegre com monograma próprio e as 50 peças de cerâmica portuguesa em diálogo com a tapeçaria “Zodíaco” de Jean Lurçat, há muito para ver e saborear.
Inserida no Tivoli Avenida Liberdade, a Cervejaria Liberdade tem mais de um século de história nas paredes. Desde os tempos do Palacete Rosa Damasceno até ao restaurante Zodíaco, e, mais tarde, a Brasserie Flo, esta casa sempre soube reinventar-se. Desde 2017, assume-se como uma cervejaria lisboeta com rosto contemporâneo.
Com um aquário à entrada, marisco à vista, cocktails de autor e peixe do mar na grelha, a Cervejaria Liberdade não renega o que foi, aperfeiçoa-o. E, ao contrário do que escrevemos em 2021, agora, é um restaurante onde o mar entra pela porta da frente.
O SAPO Lifestyle esteve na Cervejaria Liberdade a convite.