Não, a Educação não perdeu valor

Nas últimas semanas, assistimos a várias vozes – entre académicos, dirigentes e professores universitários – a questionarem a relevância do ensino superior. Confesso que me espanta ouvir tal discurso, sobretudo em Portugal, um país que ainda enfrenta sérios défices de formação da sua população.

A perplexidade é maior quando são precisamente aqueles que tiveram acesso à melhor educação, que construíram carreiras brilhantes e que continuam a beneficiar de salários e prestígio graças ao conhecimento adquirido, os mesmos que agora sugerem que “já não vale a pena estudar”. É um pouco como ouvir um multimilionário afirmar que “o dinheiro não importa”. Claro que importa – não apenas pelo conforto material, mas pela segurança que proporciona em momentos críticos. O mesmo acontece com a educação: é ela que abre portas, dá opções e continua a ser, ainda hoje, a mais poderosa ferramenta de mobilidade social.

Como explicar então a tantos pais que sacrificaram recursos, poupanças e horas de trabalho extra para garantir que os filhos chegassem ao ensino superior que, afinal, “não vale a pena estudar”? Como justificar semelhante argumento perante famílias que veem na formação uma esperança real de ascensão social? E, mais importante ainda: quantos dos que hoje dizem que o ensino perdeu valor recomendam aos seus filhos: “vão mas é trabalhar!”?

O problema não está no valor da educação, mas na forma como formulamos a questão. Não se trata de saber se o ensino tem valor, mas de perguntar como podemos dar mais valor ao ensino. Sim, muitos métodos continuam presos a modelos antiquados. Sim, a inovação é necessária e urgente. Mas confundir a necessidade de reformar práticas pedagógicas com a ideia de que estudar perdeu relevância é uma perigosa simplificação.

Outro ponto que merece reflexão é a crescente narrativa de que Portugal deve afirmar-se como “exportador de ensino”. É uma ambição legítima, mas que precisa de ser enquadrada. A esmagadora maioria das universidades portuguesas são públicas e dependem, no todo ou em parte, do financiamento do Estado. A sua missão primeira, portanto, não pode ser a exportação, mas a contribuição decisiva para o desenvolvimento económico, social e cultural do país.

Acresce ainda uma preocupação com a prática, cada vez mais frequente, de lecionar programas exclusivamente em inglês. A internacionalização é vital e deve ser promovida, mas a exclusividade da língua inglesa levanta riscos sérios de exclusão social. Basta olhar para a realidade: quantos jovens, vindos da escola pública, com 18 anos, dominam suficientemente a língua inglesa para frequentar com sucesso um curso superior integralmente técnico e académico noutra língua que não a sua? Ao invés de abrir horizontes, esta opção pode criar barreiras adicionais para aqueles que já enfrentam obstáculos no acesso à educação.

Portugal não pode dar-se ao luxo de desvalorizar o ensino. Precisamos de formar mais e melhor. Precisamos de um ensino superior capaz de inovar, de se adaptar e de servir tanto os indivíduos como as instituições e a sociedade no seu conjunto.

Se quisermos um país mais justo e competitivo, não podemos desvalorizar o ensino – temos, isso sim, de o reinventar todos os dias.