Os riscos que vêm de França

A França vive uma fase de turbulência política e orçamental, o que pode afetar Portugal.

Em 2024, a dívida pública francesa atingiu 113% do PIB e o défice 5,8%, colocando o país sob procedimento por défice excessivo. Os juros soberanos a 10 anos subiram de 3% em dezembro para 3,36% em julho e o prémio de risco disparou, num contexto em que a aprovação de cortes orçamentais é incerta e o governo pode cair já a 8 de setembro se a moção de confiança for rejeitada. O ministro das Finanças francês admitiu, nesse cenário, uma intervenção do FMI.

A presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, considera a queda de qualquer governo do euro “preocupante” e está a acompanhar de perto o alargamento dos spreads franceses, sublinhando que o sistema bancário é resiliente. O BCE tem instrumentos para conter a fragmentação do euro, como o Transmission Protection Instrument (TPI), mas a sua ativação é condicional a políticas sustentáveis, não sendo um ‘cheque em branco’ para financiar défices estruturais.

Para Portugal, os riscos são diretos e indiretos.

Diretos, porque a França é o nosso 3º mercado de exportação de bens (12% do total em 2024), o 5º no turismo (8% das dormidas nesse ano; dados do INE) e o 3º no stock de investimento direto estrangeiro (8% do total no final de março, segundo a AICEP). Por isso, uma recessão ou aperto orçamental abrupto em França – imposto pelo governo ou por credores externos, como o FMI – significaria menos exportações, turistas e investimento em Portugal.

Indiretos, porque um choque francês reabriria debates no orçamento da União Europeia (UE) e poderia levar a um corte mais abrupto de fundos para Portugal, fragilizando ainda a capacidade europeia de apoiar a Ucrânia.

Portugal está hoje menos exposto aos mercados de dívida soberana após a subida recente do rating soberano para A+ pela S&P com perspetiva estável, refletindo a desalavancagem efetuada e o crescimento da economia, mas insisto que este se deve, em grande medida, a efeitos temporários do surto de turismo (já em abrandamento) e do PRR, permanecendo bloqueios estruturais que determinam uma baixa produtividade e um reduzido nível de vida na UE.

Neste contexto, e numa altura em que se aproxima a negociação do Orçamento de Estado de 2026, é crucial preservar contas públicas saudáveis, com rigor e reformas pró-crescimento, exigindo-se, nomeadamente, impactos da reforma do Estado na contenção da despesa para acomodar uma baixa maior da carga fiscal e mais investimento público reprodutivo – de modo a contrariar anos a fio de subexecução e a queda esperada dos apoios da UE a partir de 2027.

Para mitigar dos impactos diretos na economia, o Governo deverá reforçar os apoios à diversificação de mercados. Ao risco nos EUA, devido às tarifas de Trump, junta-se a redução da procura em França e, possivelmente, no Reino Unido, com uma situação orçamental também preocupante.

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