Riscos franceses para a UE

A economia francesa tem tido um potencial de crescimento relativamente baixo, cerca de 1%, mas não se pode dizer que esteja com grandes dificuldades conjunturais. Em 2025, o PIB deverá crescer um pouco abaixo da média recente, mas a taxa de desemprego, abaixo dos 8%, está nos melhores valores dos últimos trinta anos. Ou seja, a situação económica não é especialmente desafiante.

O que torna as questões orçamentais mais intratáveis. Se os problemas de contas públicas decorressem de uma conjuntura difícil, então, uma recuperação, que surgiria mais tarde ou mais cedo, ajudaria ao equilíbrio orçamental. Infelizmente, não se podem esperar grandes ajudas da economia.

Em 2019, o défice estava controlado (2% do PIB) e a dívida estava relativamente estável, nos 98% do PIB. Com a pandemia, a situação complicou-se, como na generalidade dos países, com subida da dívida para 115% do PIB em 2020, mas posterior correcção para 110% do PIB em 2023. No entanto, o défice permaneceu acima dos 5% do PIB, enquanto a economia deixou de ter margem para crescer acima do potencial. Desde então instalou-se uma trajectória insustentável de subida da dívida, que deverá atingir os 116% do PIB este ano e chegaria aos 130% do PIB em 2030, de acordo com o FMI, se nada mudar.

Talvez se possam tomar algumas medidas para aumentar o potencial de crescimento da economia gaulesa, mas não pode haver grandes ilusões sobre os seus resultados. Uma das vias, o aumento da imigração, é politicamente proibitiva, para além de que apenas produziria resultados económicos e orçamentais no curto e médio prazo.

Ou seja, mais do que um problema económico, a França tem um grave problema orçamental. Para o resolver serão necessários, em geral, aumentos de impostos e cortes na despesa. Dado que o peso do Estado é já dos maiores da UE, parece que não há grande margem para aumentar a receita fiscal (fala-se num imposto sobre as grandes fortunas), mas parece que o essencial da correcção terá que vir pelo lado da redução da despesa pública.

Impostos sobre uma minoria rica poderão não ser difíceis politicamente, mas a austeridade é sempre dinamite política. Em qualquer país, isto já seria muito exigente, mas a conjuntura política francesa é especialmente ingrata. Ao contrário, por exemplo, da Alemanha, onde há maleabilidade para formar maiorias com as mais variadas geometrias, o espaço partidário francês está dividido em três grupos (esquerda, direita moderada e extrema-direita), de dimensão semelhante, mas em posições irredutíveis, como a aldeia gaulesa de Astérix.

O mais provável é que a coligação que controle o défice público poderá contar com um longo jejum posterior de poder, pelo que nenhum grupo está disposto a apoiar o que é necessário fazer, preferindo resguardar-se para depois colher os frutos. É muito desafiante imaginar como se resolverá esta questão, por mais que mude o primeiro-ministro, o parlamento ou o presidente.

Os mercados financeiros estão, naturalmente, inquietos, tendo os juros da dívida francesa ultrapassado, de forma inédita, os da italiana. Que pressões financeiras surgirão nos outros países, incluindo Portugal? O que terá o BCE que fazer? Que tensões surgirão na própria UE? São questões com que teremos de nos ocupar nos próximos tempos.