
Sabemos mais, temos mais meios, investimos mais. Mas por que continuamos a enfrentar incêndios devastadores, ano após ano? O que nos impede, afinal, de transformar conhecimento em prevenção eficaz?
Quero acreditar que, apesar de tudo, há uma aprendizagem em curso. Que começamos a reconhecer erros acumulados e a rejeitar a ideia de que arder é inevitável. E que somos cada vez mais os que desejam, e exigem, uma nova relação com a floresta e o território.
Grande parte do território tornou-se perigosamente inflamável. Por um lado, a expansão de monoculturas florestais criou paisagens homogéneas e frágeis, fruto de decisões tomadas num contexto de abandono rural, que deixaram um legado de risco acumulado e dependência de modelos extrativos. Por outro, o problema fundiário continua a ser um dos maiores bloqueios: a ausência de cadastro atualizado, a fragmentação da propriedade e a falta de modelos de gestão conjunta dificultam qualquer resposta eficaz.
A isto soma-se a pressão climática. A região mediterrânica aquece mais depressa do que a média global. Ondas de calor prolongadas, vegetação seca, ventos imprevisíveis e humidade reduzida criam condições ideais para que qualquer ignição se transforme num desastre. Esta realidade já instalada vem agravar vulnerabilidades há muito conhecidas, como o despovoamento, o envelhecimento, o colapso das economias locais e a perda de capacidade institucional.
Mas há sinais de que outro caminho é possível. Nas poucas zonas onde subsistem fragmentos de floresta nativa, a frequência e severidade dos incêndios são menores. Não por acaso, mas porque essas áreas têm estrutura ecológica, diversidade funcional e gestão adaptada ao contexto. O contraste é evidente em locais como a Mata da Margaraça, um raro fragmento de floresta autóctone onde carvalhos, castanheiros e outras espécies formam um ecossistema resiliente. Ainda assim, em vez de multiplicar “Margaraças”, continuámos a expandir monoculturas que agravam o risco de incêndio e a escassez hídrica.
Cada verão sem preparação é mais um capítulo de empobrecimento silencioso. Faltam instrumentos de governança partilhada, incentivos eficazes e políticas públicas capazes de integrar o mosaico fragmentado do território numa visão comum. A mudança exige ação articulada e duradoura, práticas adaptadas ao território, como o pastoreio, o uso da biomassa, modelos cooperativos de gestão e regras claras para proteger zonas críticas.
Nada do que aqui escrevo é novo. Estamos perante um problema estrutural e complexo, sem soluções fáceis nem respostas rápidas. Mas o mais inquietante é termos começado a aceitar a sua inevitabilidade. Essa resignação é, talvez, o maior risco de todos. Precisamos de romper com a normalização da perda. Precisamos, com urgência e convicção, de agir.